Antes de partir de Madagascar já havíamos decidido que Moçambique
seria um país de passagem, e que não faríamos entrada.
Vários sites confiáveis diziam que: além das taxas normais
cobradas pelos órgãos reguladores, os próprios oficiais, ainda com a posse do
seu passaporte cobram taxas extras e se não as pagar, não os devolvem.
Como os oficiais da África do Sul são cientes desses
acontecimentos, eles são muito compreensivos, permitindo a entrada, ficando
aguardando a emissão de um novo passaporte em sua embaixada.
Enfim: seguiríamos até Bazaruto – Moçambique, aguardaríamos
o bom tempo e partiríamos para Inhaca e daí para África do Sul aproveitando a
correnteza, num total de mil e cem milhas.
Em Bazaruto um dia após a nossa chegada, observamos redes de
pesca em nossa volta, e com o mar soprando do mar para terra, mais a
correnteza, tivemos certeza que a rede (enorme) iria nos pegar. Até porque o
Catamaram que estava um pouco a frente, já estava envolvido pela tal rede.
Muitas pessoas na praia gritando e apenas um homem e uma
criança, de no máximo dez anos, estavam em uma pequena canoa recolhendo a rede.
Quando a rede nos alcançou, pensamos até em cortá-la, mas
logo percebemos que não seria uma boa ideia pois não sabíamos a reação do povo
local com tal atitude. Não queríamos nenhum problema naquele país, ainda que a
correnteza mais a maré vazante, mais o arrasto provocado pela rede fossem
enormes sobre a âncora. Depois de algumas horas, problema resolvido.
Sempre vinham canoas pedindo dinheiro em troca de peixes.
Nós não tínhamos dinheiro local - metical, e acabamos por oferecer camisetas,
pensando que haveria escambo, assim como em Madagascar. Mas além de não nos
oferecerem nada, até aí tudo bem, ainda acharam pouco e foram ríspidos conosco.
E nós entendíamos tudo, já que em Moçambique se fala português.
Passados dois dias, o vento aumentou e as ondas subiram. Nessa
noite havia muito barulho das ondas no costado, o vento e os cabos batendo no
mastro. Quinze para as duas da manhã, meu avô que é muito atento aos sons do
barco, ouviu um barulho diferente, mas não achou que seria algo muito
importante. Mesmo assim ele foi para o cockpit e logo viu uma pessoa pegando os
cabos que ficam na popa. Meu avô logo correu em sua direção, mas o pirata, da
plataforma pulou para o bote, e assim que meu avô puxou o cabo que estava
interligando o seu bote ao nosso barco, percebeu que já havia sido cortado com um
facão, desaparecendo na escuridão, fugindo por entre os baixios que um veleiro não
pode passar.
Com muitos xingamentos no momento, eu e minha avó acordamos,
e logo percebemos que além dos cabos, ele havia estourado o cadeado do motor e
tinha levado também, nosso motorzinho de 5 HP de apenas dois meses de uso.
Ficamos extremamente chateados, e todos os dias após,
dormimos trancados e superatentos, pois não sabíamos se voltariam. O que nos
deixou um pouco mais tranquilos, foi que nada de grave pessoalmente aconteceu.
Pensamos até em falar com as autoridades, mas logo
desistimos da ideia, não queríamos ficar nem um minuto a mais naquele país,
pois o que poderíamos esperar de um país com um AK47 na bandeira. É o único
país no mundo que tem na bandeira uma arma de fogo.
Ainda chateados, partimos para Inhaca, depois de 8 dias
aguardando bom tempo, onde encontramos mais dez barcos reunidos. Num deles, os
americanos nos convidaram para uma ceia do Dia de Ação de Graças. Foi quando as
tripulações de todos os veleiros ficaram reunidos. Também descobrimos que não
fomos os únicos a ser roubados, outros dois haviam também recentemente passado
pela experiência em Moçambique e também em Madagascar; de um deles levaram o
motor de popa, e do outro por duas vezes invadiram o barco, e os ameaçaram com
facas, levando tudo de valor.
Ficamos reunidos em Inhaca por longos 13 dias. Como não
tínhamos motor, nem em terra podíamos descer pois, o vento era bem forte. Três
argentinos de um dos veleiros sempre traziam ovos, frutas, verduras e legumes
para nós. E em um dia nos levaram para terra, onde conseguimos por algum tempo
um pouco de internet. Retribuímos os argentinos, com um lanche/jantar e um
almoço.
Num desses dias de espera, o vento chegou a 49,9 nós, e
ouvimos de outro barco que estava um pouco mais longe que o seu WIND (equipamento
que mede a velocidade do vento e direção) chegou a 70 nós! Foi nesse dia que um
barco perdeu seu bote para o vento, e foi levado mar afora (o mesmo que fora
por duas vezes assaltado).
Fizemos um plano de viagem para África do Sul: sairíamos em
direção a Richard’s Bay com a ajuda da correnteza e dos ventos, e quando
estivéssemos a meio dia do porto de chegada, pararíamos, aguardando uma baixa
passar a nossa proa. Isso na teoria, porque na prática não conseguimos parar - sem velas o nosso barco estava andando a 5 nós
por causa da correnteza, mas deu tudo certo, a baixa se desfez e chegamos em Richard’s
Bay, África do Sul.
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